Este blog está relacionado aos diversos projetos centrados na diversidade e pluralidade étnico-racial que desenvolvemos, sempre de forma coletiva e colaborativa, nas instituições educacionais e educativas onde atuamos como EDUCADOR, seja como professor, coordenador de núcleo educacional, assistente de diretor de escola ou diretor de escola.

Pois, consideramos de extrema importância, desde o início e durante todo o processo educacional, a proposição acerca da questão da IDENTIDADE, pois penso que o país e a sociedade, como um todo, só tem a ganhar com pessoas conscientes e bem resolvidas nesse contexto.

Acredito que esta FERRAMENTA, com os seus conteúdos e informações (textos, imagens, atividades entre outros), nos possibilitará acessar informações relativas ao que há de africano no Brasil, assim como referente ao continente africano, tão vasto e múltiplo, que pouco conhecemos aqui no Brasil.

Nos possibilitará também, valorizarmos a diversidade étnico-cultural, étnico-racial, a partir do debate, reflexão e estímulo a valores e comportamentos éticos como o amor, a amizade, o respeito, a solidariedade e a justiça, de forma que a todo o momento possamos nos posicionar contra qualquer forma de intolerância, e especificamente nos colocando contra todo o tipo de discriminação racial e a favor de práticas antirracistas.

21 março 2010

Rosa Parks

Amigos,

Acredito que todos nós deveríamos parar por um momento para relembrar o simples, significativo e audacioso ato de coragem e dignidade de Rosa Parks, quando ela se recusou a ir para a parte de trás de um ônibus porque a lei dizia que ela tinha a cor de pele errada. Os maiores momentos na história, aqueles que realmente importaram e nos levaram para um lugar melhor, são ancorados por estes atos singulares de pessoas comuns, que não puderam mais tolerar as bobagens e atitudes sem sentido daqueles que estão no comando.
Hoje, seja por um estudante que se manifesta contra os recrutas do exército no colégio ou pela mãe de um soldado morto que se recusa a deixar o portão da frente do rancho do presidente, nós continuamos a ser salvos pela brava gente que se expõe ao ridículo e à rejeição, mas que conseguem atrair a atenção da opinião pública na direção do que é correto. Temos enormes débitos de gratidão com essas pessoas. Não é fácil se mobilizar para o que é certo, especialmente quando todos estão com medo de deixar o confortável caminho do conformismo.
Rosa Parks talvez estivesse sozinha no ônibus no momento da sua prisão, mas ela não ficou sozinha por muito tempo. A velha ordem foi abalada, o mundo se abriu e, como pessoas, nos foi dada a chance de um pouco de redenção.
Talvez, o melhor jeito de celebrar o mais importante dia da história americana seja perguntar para você mesmo como pode fazer a diferença hoje. Que risco você pode correr com isso? O que está esperando para dizer aos seus companheiros de trabalho ou colegas de classe o que tinha medo de dizer, mas que no fundo do seu coração você sabe que precisa ser dito? Por que esperar outro dia para dizer?
(...)
Cinqüenta anos depois, o ônibus em que agora nos encontramos poderia ter um pouco mais de gente corajosa e disposta a dizer “Basta! Já chega. Eu não vou aturar mais."

Cordialmente,

Michael Moore

Fonte: MOORE, Michael. Rosa Parks: cinqüenta anos, hoje. Consciência.net, 02 Dezembro 2005. Disponível em: Acesso em: 28 Janeiro 2006.

16 março 2010

UNIVERSIDADE E POVO


"Que la Universidad se pinte de negro, de mulato, de obrero, de campesino... Que se pinte de pueblo... " (Che Guevara )



Fonte: Sítio Procampo www.pa.gov.br/portal/procampo
             Sítio UFF www.uff.br/nepae/siteantigo/bnn042702.htm

15 março 2010

AÇÃO AFIRMATIVA (2)

Continuação da entrevista exclusiva à Agência Carta Maior com o professor Hélio Santos:
As mulheres, os deficientes e até mesmo os gordos, os “feios”, aqueles que fogem de um padrão de estética imposto pela mídia também sofrem preconceito no mercado de trabalho. Por que, então, os negros deveriam ter privilégio sobre os outros excluídos?
Usar a expressão excluídos para os outros, no Brasil, pelo menos, me soa um pouco forte. Eu não tenho a menor dúvida de que temos necessidade de políticas específicas para a mulher no Brasil, apesar dos avanços. Mas se a gente for hierarquizar aqueles que têm dificuldade, há um estudo que coloca a renda média nesta ordem decrescente: homem branco, mulher branca, homem negro e, por último, mulher negra. Eu gostaria que a mulher branca não sofresse esse prejuízo em relação ao homem branco, mas eu estou hierarquizando as dificuldades. Ela não está tendo, injustamente, um reconhecimento no patamar que ela deveria ter, mas ela não está vetada como os negros. Você pode imaginar, por exemplo, o preço que uma mulher engenheira pagaria por ser negra num país o qual todos os estudos denunciam ser velada e sofisticadamente racista? No Brasil, nascer branco é um passaporte que dá algumas vantagens em relação aos outros. Além disso, já há políticas de cotas para deficientes em concursos, para mulheres em sindicatos e eleições...As primeiras políticas de ação afirmativa no Brasil foram dirigidas a europeus que vinham para cá na condição de imigrantes. Alguns conseguiram terras, em vários pólos de desenvolvimento receberam recursos. E, na minha opinião, receberam com razão. Eram pessoas que chegavam aqui, não dominavam o idioma português, vinham para colonizar o Brasil, ocupar o espaço. O Estado investiu nelas. Foi importante fazer isso com os alemães, com os poloneses. O que acho um escândalo é o mesmo não ter sido feito com os negros quando houve a abolição. E quando se fala, agora, em uma política ainda muito modesta de ressarcimento, a reação da sociedade, especialmente da mídia, é muito ruim.
Em um processo de vestibular ou num concurso público o que exclui, teoricamente, é a capacidade intelectual, que não depende de raça, mas de oportunidades de estudo. Então, por que estabelecer cotas na universidade? O problema não é anterior?
Evidentemente que a esmagadora maioria da população negra é semi-alfabetizada. Se considerar a população negra pobre, em grande medida ela quer comida, calçado, casa. É uma população que não está pensando em vestibular. Mas há uma parcela, estudantes negros que têm dificuldade de entrar na universidade pelo processo que aparentemente é do mérito. Há sempre três argumentos contra as cotas nas universidades: que o que conta é o mérito, que não cabe à universidade resolver os problemas sociais e que o que impede a população negra de chegar á universidade é a baixa qualidade do ensino público. Vamos discutir o que é mérito. Imagine uma moça que mora no bairro dos Jardins e com três anos já estudava inglês, tinha computador, motorista, alimentação, auto-estima, carinho, estudou nas melhores escolas, fazia natação, pólo, bom cursinho...com 17 anos concluiu o colegial e vai tentar o vestibular de Medicina da USP. Agora vamos imaginar uma menina negra, pobre, lá de Guaianazes ou de Bangu, que com oito ou 10 anos já trabalhava para ajudar a mãe, o pai evadiu cedo por causa dessa estrutura social niilista, sua é auto-estima rebaixada, convive com a violência. Essa menina, que nunca teve nada, é uma flor do pântano que com 17 anos conclui o colegial numa escola da periferia. Aí você coloca as duas lado a lado e diz que são candidatas e vamos ver quem tem mais mérito. Não há como condenar a menina dos Jardins, cujos pais fizeram muito bem em investir nela. O absurdo é dizer que uma tem mérito e a outra não tem. O que é mérito na sociedade brasileira? Nas universidades temos sempre a mesma clientela que supomos ter mérito. Eu questiono esse mérito. Quanto ao argumento de que não caibo à universidade resolver os problemas sociais, eu digo que foi a universidade brasileira que produziu esse país que conhecemos, com a maior concentração de renda do planeta. Esta elite que vai para as universidades públicas, que está dirigindo o país no campo político, empresarial, na mídia, produz dois Brasis: um rico, que pode ser confundido com a Bélgica ou com a Holanda, e um Brasil anacrônico. Há um componente de injustiça profundo. Por fim, quanto à baixa qualidade do ensino público, sabemos que a escola pública é muito ruim, enquanto a escola privada é de excelência. Por isso, as políticas de ação afirmativa devem selecionar os melhores daquele segmento a partir de parâmetros mínimos. Os que vêm da escola pública não têm notas altíssimas, mas têm condições de desenvolver o curso, isso que é importante. Ninguém pode entender que política de cotas significa colocar dentro da universidade pessoas sem condições de tocar o curso. Para algumas áreas, Medicina, Ita e outras universidades de ponta, eles terão que participar da seleção e ficar durante um tempo se adaptando para estar em condições de desenvolver o curso. O problema é que essas políticas não foram precedidas de um debate. É razoável todo este tumulto, estamos aprendendo, mas temos que definir e desenvolver um modelo apropriado. Se há distorções, precisam ser corrigidas.
As cotas para estudantes oriundos de escolas públicas não resolvem este problema?
Não, pois há componentes subjetivos. Há estudos que mostram o que se passa na sala de aula. O primeiro estudo, feito pela Fundação Carlos Chagas em meados dos anos 80, mostrou brancos e negros de mesma classe econômica, brancos e negros – era impressionante a quantidade de vezes que os negros repetiam, abandonavam a escola e retornavam e evadiam. Isso está ligado àquela estrutura niilista, de auto-estima rebaixada, de não ter a educação como referência importante na vida, de famílias desestruturadas. Em uma família negra de classe média baixa com cinco filhos, nenhum vai à universidade. Em uma família branca, dois ou três estão na universidade, às vezes todos, até mesmo em universidade privada, noturna. O isso significa? Que há dificuldades verdadeiras. Quem quiser trabalhar com esta temática terá que estar pronto para investir na psicologia social. Esse discurso classista, ideológico que nós tanto gostamos é insuficiente para explicar isso.
As políticas de cotas também são chamadas de políticas de discriminação positiva. O próprio nome já não indica a perpetuação da diferença?
A verdade é que já há discriminação, só que é negativa e ninguém questiona. Eu sou a favor da redução da cota de 100% para brancos que existe na sociedade brasileira. Há cotas para as quais nunca houve leis e ninguém questiona. Um exemplo é a cota de 100% para diplomatas no Itamaraty. São todos brancos. O curso de Medicina da USP é todo amarelo e branco, não há negros. Como é que você quebra essas cotas que foram inventadas pela nossa estrutura social, apartheísta, excludente? É possível tratar todos igualmente? Quando você trata a todos, inclusive os excluídos, igualmente, no fundo você não quer igualdade. Se você quer verdadeiramente a igualdade, tem que tratar as pessoas diferentemente a partir de suas necessidades – aí você vai produzir alguma igualdade. Discriminação Positiva é uma expressão ruim, pois, a rigor, toda discriminação é ruim. Mas se a discriminação é momentânea e tem como intenção terminar com as desigualdades, eu a considero, positiva.
 O sistema de cotas não poderá vir a incentivar a discriminação entre os alunos?
                    Eu assumo a minha culpa nisto por ser um militante do movimento negro. Eu tinha que capacitar o negro a responder o seguinte para os colegas brancos: “eu só entrei na universidade dessa forma porque o seu tetravô escravizou o meu, mas o meu bisneto vai entrar de forma diferente”.Alguém já me perguntou: será que um engenheiro que entrou pela política de cotas é tão engenheiro quanto o outro? Ora, depois que entra na faculdade você tem de passar por cinco anos de curso, tem trabalhos, tem que ter um volume de freqüência tem que tirar notas mínimas...quando você conclui, lá na frente, é um engenheiro sim. Nos EUA, foi feita uma pesquisa com os alunos negros que tinham utilizado políticas de cotas para ingressar em universidades de ponta como Columbia, Harvard, Stanford, NYU, Berkeley... Como era previsível, a pesquisa revelou que a grande maioria dos negros entrou com média inferior a dos brancos. Ao longo do curso, também obtiveram notas em média inferiores às dos brancos. Mas depois, provavelmente estimulada por uma auto-estima nova que conquistaram, a maioria foi fazer curso de mestrado e doutorado, na mesma proporção que os brancos. Em áreas mais sofisticadas na cultura americana, como Direito e Medicina, os negros chegaram a superar os brancos em proporção nos cursos de mestrado e doutorado. E estas pessoas, na sua quase totalidade, depois foram desempenhar algum trabalho junto à comunidade. São negras e negros que passaram por universidades de ponta, fizeram um ensino de excelência e não ficaram cuidando de suas vidinhas, trabalhando em Wall Street e ganhando seu dinheiro. São pessoas que deram retorno para a comunidade, tornaram-se lideranças importantes. Isso é fantástico. O conceito de inteligência e de produção de conhecimento passa por aí. Não quero formar pessoas com mérito estrita e rigorosamente egoístas, para construir essa sociedade que nós temos no mundo. Peço que a sociedade brasileira entenda que estas políticas não beneficiam os negros, essas políticas beneficiam ao país.

12 março 2010

AÇÃO AFIRMATIVA, IGUALDADE E DIGNIDADE


“Quem tem bisavô negro acumulou perdas que devem ser reparadas”. (Hélio Santos)

AÇÃO AFIRMATIVA (1)


Nesta entrevista exclusiva à Agência Carta Maior o professor Hélio Santos, doutor em Administração e mestre em Finanças pela Universidade de São Paulo (USP), professor da Universidade São Marcos (São Paulo) e da Fundação Visconde de Cairú (Bahia) e fundador e presidente do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo (1984), mostra que Políticas de Ação Afirmativa, como o sistema de cotas, não beneficiam os negros, mas, sim, o país, pois possibilitam a inclusão dos excluídos. Santos faz um mergulho na história do Brasil, lembra que imigrantes italianos e alemães também já foram alvo de políticas especiais em outras épocas e proclama: “não há política universalista que dê conta de ajustar o Brasil”. 
                      O que são políticas de ação afirmativa?
                     São políticas, públicas ou não, voltadas para populações que, em razão de motivos históricos, acumularam perdas. Essas políticas buscam reparar essas perdas. E uma coisa é certa: quem teve um bisavô negro acumulou perdas. Essas pessoas têm um crédito. O carma brasileiro da exclusão do negro deve acabar. A sociedade brasileira exclui com muita competência. Houve um zelo ibérico para excluir e um esforço parecido deve ser feito para incluir, sempre lembrando que as políticas de ação afirmativa não são para todo o sempre. Se forem bem aplicadas, podem deixar de existir em 30 anos. A sociedade terá alcançado um nível de homogeneidade que fará com que essas políticas sejam desnecessárias.

                   As políticas públicas universalistas ou generalistas, voltadas para toda a população, dão conta de propiciar um desenvolvimento social adequado e harmonioso?
Para responder a essa pergunta é preciso fazer uma síntese histórica. A escravidão durou 350 anos, a maior parte da história do Brasil, e a abolição, da forma como se deu, não propiciou uma igualdade efetiva. Entendeu-se, a partir de 14 de maio de 1888, que aqueles que tinham sido escravos por 350 anos eram precisamente iguais àqueles outros que nunca haviam sido escravizados. A partir daí, sem nenhuma ação especial, imaginou-se que a cidadania era de todos. Joaquim Nabuco dizia que terminar com a escravidão não era importante. O importante era terminar com os efeitos da escravidão. Nós internalizamos componentes subjetivos que estão ainda hoje colados à nossa alma. Não há política universalista que dê conta de ajustar o Brasil. Para todos nós, as políticas universalistas representam o que há de mais avançado, e quando se pede políticas específicas para os negros de certa forma colidimos com este ideal. Mas a dívida histórica do Brasil para com a população negra pode ser paga desta forma. Estas políticas apenas aparentemente beneficiam a população negra. Elas estão focadas nos negros, mas o benefício é coletivo. Pois o país adquire um componente de cidadania, deixa de ser historicamente inconcluso.  
Qual deve ser a abrangência destas políticas de ação afirmativa?
As políticas específicas estão no campo da educação, no mercado de trabalho, nos concursos, nas licitações. Na área da educação, a universidade é importante, mas não é onde está a maior parte de nossos problemas. Há uma população negra, especialmente masculina, que é formada basicamente por analfabetos funcionais, pessoas que foram até a 5ª, 6ª série no máximo, nunca se aproximaram de um computador, nunca leram um livro, poucos já foram ao cinema. São brasileiros ausentes, que estão incapacitados para exercer as funções mais modestas. Há que se ter políticas de capacitação dessa população não só para negros, claro – nesse caso, são políticas que eu classifico como PMI – políticas massivas de inclusão. Mas há outras que devem ser focalizados. Em todas as instâncias do Estado, do Itamaraty às Forças Armadas, há que se fazer um esforço para se colocar o negro. O Brasil, que tem 45% da população negra, tem que “tintar” os vários escalões. Mais uma vez faço um retrocesso histórico. Com o advento das ferrovias, em SP, se necessitava de trabalhadores fixos para fazer trabalho pesado, e o negro estava apto porque há um cacoete de que trabalhos que requerem força física são para negros. Pois estes negros se estabeleceram no interior, com emprego fixo, casaram, constituíram família, adquiriram casa própria. Nenhum deles virou milionário, mas as famílias se estruturaram e os filhos estão noutro patamar - a filha virou professora, o filho foi ser sargento do Exército, bancário. O que você vê hoje nas famílias negras nas cidades? São famílias desestruturadas, onde há sempre uma mulher liderando, muitas vezes com filhos de pais diferentes, uma auto-estima rebaixada, uma casa muito pequena, violência...Todo o terreno que conhecemos para esta tragédia urbana que é o Brasil.
Com tudo isso, quero dizer, que ao negro basta pouco: o emprego fixo já é suficiente para que ele demonstre essa capacidade de mobilidade social. Hoje o negro é discriminado mesmo no emprego modesto. Assim, os movimentos negros reivindicam, além de cotas em concursos públicos, que a presença de funcionários negros seja um quesito para participar de concorrências públicas. Nos EUA é assim: o Estado não tem como admitir tanta gente nem obrigar as empresas a contratar negros, mas a empresa que quiser vender para o Estado terá que admiti-los. As políticas públicas devem também trabalhar com a construção de uma estética, de uma identidade nacional. Você tem todo um país de mestiços focado num ideal estético que é escandinavo. Nossa identidade é um mosaico, é múltipla, rica, mas sonhamos com o linear. Temos um pomar com todas as possibilidades de frutas, mas insistimos em servir sempre uva Itália. Há que se fazer um esforço de políticas públicas nos meios de comunicação, refletindo nossa identidade – os adolescentes negros precisam se ver na mídia. Enfim, as políticas de ação afirmativa, que são as políticas específicas, são sofisticadas e não se restringem, como vem se colocando, à universidade.

Fonte: Agência Carta Maior - abril/2003

07 março 2010

CRÍTICA AO LIVRO: "A ÁFRICA ESTÁ ENTRE NÓS"

Crítica ao livro:
"A África Está em Nós"
História e Cultura Afro-Brasileira
Primeiro Volume
Autor: Roberto Benjamim
(Roberto Emerson Câmara Benjamim)
Editora Grafset Ltda.

Infelizmente acabei de ler agora no mês de agosto/2006 o livro "A África Está em Nós" de Roberto Benjamim, publicado pela editora Grafset em 2004. Digo infelizmente porque gostaria de ter lido muito antes e é uma pena que somente agora chegou as minhas mãos. Esse livro até onde tenho conhecimento, por falta de outro, e não sei se o Ministério da Educação através de seus departamentos já adotou algum livro didático que sirva de baliza para execução na prática as determinações da Lei Federal, está sendo "adotado" por alguns professores, principalmente de História, cheios de boas intenções, para "orientar" os seus alunos com relação a História da África.

Achei oportuno o lançamento do livro. Acredito ter sido um dos primeiros livros, se não o primeiro de que tomo conhecimento de abordar o assunto com essa diversidade, logo após a publicação da Lei Federal 10.639/03. Fico surpreso com a bibliografia utilizada mas desagrada-me o resultado. Observo que a linguagem do professor Benjamim é eivada de preconceitos. Como militante do Movimento Negro e dos Direitos Humanos estamos acostumados; não estou querendo justificar que é algo bom e que tranqüilamente faz parte do nosso dia-à-dia já que com certeza também nos acostumamos a nos reservarmos e preservarmos dos acontecimentos que têm o intuito de nos maltratar. Isso que escrevo como costume poderia ser colocado como uma espécie de exército de reserva a semelhança de nossa defesa interna através dos anticorpos ou/e até a nossa defesa externa dos animais peçonhentos.

Já na página 20 do referido livro o autor, no "ponto 1.3 - Denominações afro-brasileiras", no item quarto, pela ordem, denominado EWE, decorre o texto escrevendo: EWE - 1. Povo da África Ocidental (que hoje habita o Benin, o Togo e Gana), de onde procederam escravos para o Brasil...". Parece-me que o autor, que também é advogado, com a sua linguagem "coloquial" de escritor, branco, conservador, racista e sem nenhum compromisso com a mudança; indigno de ser considerado parceiro já que temos inúmeros intelectuais brancos e de outras etnias que são verdadeiramente parceiros, não busca novos horizontes no universo da educação brasileira pregado pela "regulamentação da Lei Federal 10.639 de 09 de janeiro de 2003", através das "Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Etnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana" aprovado pelo Conselho Nacional de Educação em 10 de Março de 2004.

Na sua linguagem racista, preconceituosa e discriminatória, o autor usa a palavra escravo como adjetivo pátrio fazendo-se presumir que exista um país denominado "escravolândia" ou algo parecido. Benjamim segue a linguagem da maioria da imprensa e/ou de educadores diretos e indiretos liderada pelo Sistema Globo de Comunicação (vide discussão em torno de outro livro, o Não Somos Racistas de Ali Kamel, diretor executivo da Rede Globo), que planeja e põe no ar no seu jornal de maior audiência manchete como a que ouvimos a poucos dias passados: "Dia de festa para descendentes de escravos".

No livro inteiro o Senhor Benjamim nada faz para mudar essa linguagem racista, discriminatória e preconceituosa criada, difundida e conservada pelos seus antepassados, citando várias vezes que determinados países ou regiões da África era de onde vinham os "escravos". Linguagem essa que cada vez mais ajudam a perpetuar a imagem do negro subserviente e fraco e que pelo seu passado de descendente de "escravos" obviamente jamais poderá galgar altos postos neste país.

É necessário deixar nítido para o Sr. Benjamim e outros racistas de plantão que, se existe um povo descendente de "escravos!" existe também um povo descendente de escravisadores. Um povo que tratava outro povo como coisa, animal; que assassinava ao "bel prazer" aqueles seres que não correspondiam as suas (deles) expectativas; que estupravam as negras para encobrir fracassos sexuais de seus casamentos forjados assim como as doenças e/ou a frigidez de suas esposas. Este senhor acha que é isso que a escola brasileira deve continuar ensinando? É com base nessa educação, eurocêntrica, discriminatória, preconceituosa e racista que devemos abordar a história de nossos antepassados? Senhor Benjamim e demais seguidores, nós negros e negras não somos descendentes de escravos! Somos descendentes de africanos que por um determinado período fomos escravizados. A escravidão não nasceu com os negros e negras africanos (as) como o senhor com certeza é sabedor já que tem muito mais informações do que eu. Uma pessoa do quilate desse senhor quando intencionalmente escreve desta forma em um livro que se pretendia didático tem o objetivo claro (como os senhores adoram falar), de manter cada vez mais os negros e negras distantes de uma auto estima impedindo-os de uma libertação da consciência desse povo.

Nesse livro, ainda com relação a religiosidade do povo afro-brasileiro o autor não age como um cientista mas sim como uma pessoa mais uma vez preconceituosa e a serviço da igreja católica, como nos tempos da inquisição maldita. Distorce informações sobre as religiões de matriz africana, desinforma e colabora com o atraso para que os dados verídicos sobre as religiões trazidas de além mar não sejam difundidos de uma forma mais ampla.Na abordagem internacional o autor perdeu a oportunidade de informar aos leitores/alunos do seu livro como se deu a divisão do continente africano. Há na página 91 do supra citado um pequeno gráfico que "orienta" aos alunos/leitores e como bom descendente de colonizadores o autor foge dos fatos sem deixar nítidas as condições políticas e históricas em que e como que aconteceu a invasão do "continente negro".

Não é por falta de informações pois na relação bibliográfica colocada no final do livro, que presumo que o autor tenha lido, há inúmeros livros verdadeiramente documentais que colaboram para que se tenha uma gama de informações capazes de reforçar um relato científico de como aconteceu. Na abordagem nacional há desprezo da parte do autor por todas as batalhas de transformações e mudanças neste país onde negros e negras estiveram presentes junto com todas as etnias e em grande quantidade. Só para ilustrar esta afirmativa, neste livro não há nenhuma informação a respeito da participação nas luta do povo negro do sul do país nas revoluções e guerras acontecidas principalmente nos pampas gaúchos, a partir do Rio Grande do Sul, estados e países vizinhos com vastos relatos em livros e documentos publicados/divulgados no Brasil e fora dele.

O autor, Roberto Emerson Câmara Benjamim apesar de ter perdido a grande oportunidade de se passar como um parceiros nas lutas pela emancipação (de fato) do povo negro e seus descendentes, age como proxeneta da cultura negra por alguns caraminguás pois tenta a todo custo preservar as "conquistas" de seu povo que este sim, levam e levarão sempre a pecha de terem escravizado um povo que como está escrito também em seu livro (não foi possível nesse ponto mascarar a verdade), muitos deles, reis e rainhas; príncipes e princesas. Se nós somos descendentes de "escravos" como afirmam este senhor e os meios de comunicação do nosso país, os senhores são descendentes dos escravisadores, estupradores de negros e negras oriundas da África. Exterminadores de um povo. Provocadores do genocídio do povo negro.

Os negros e negras nunca concordaram com a sua condição de escravos e hoje nós os afro-brasileiros não concordamos de maneira nenhuma com a escravização de consciências impostas por pessoas que, paradas no tempo, acreditam ainda serem os nossos tutores dominando a mídia e os organismos de educação formal e/ou informal impondo seus ditames de forma "moderna" e oportunista através do compadrio, contubérnio, insensamento daqueles que ocupam o poder. Estamos e vamos continuar atentos.

GERALDO POTIGUAR DO NASCIMENTO
 

ARTE AFROBRASILEIRA

ÁFRICA, por Cristiane Campos

03 março 2010

A ÁFRICA SOMOS NÓS! CONTRA O RACISMO...


- Escuta aqui, ó criolo...
- O que foi?
- Você andou dizendo por aí que no Brasil existe racismo.
- E não existe?
- Isso é negrice sua. E eu que sempre te considerei um negro de alma branca... É, não adianta. Negro quando não faz na entrada...
- Mas aqui existe racismo.
- Existe nada. Vocês têm toda a liberdade, têm tudo o que gostam. Têm carnaval, têm futebol, têm melancia... E emprego é o que não falta. Lá em casa, por exemplo, estão precisando de empregada. Pra ser lixeiro, pra abrir buraco, ninguém se habilita.
Agora, pra uma cachacinha e um baile estão sempre prontos. Raça de safados! E ainda se queixam!
- Eu insisto, aqui tem racismo.
- Então prova, Beiçola. Prova. Eu alguma vez te virei a cara? Naquela vez que te encontrei conversando com a minha irmã, não te pedi com toda a educação que não aparecesse mais na nossa rua? Hein, tição? Quem apanhou de toda a família foi a minha irmã. Vais dizer que nós temos preconceito contra branco?
- Não, mas...
- Eu expliquei lá em casa que você não fez por mal, que não tinha confundido a menina com alguma empregadoza de cabelo ruim, não, que foi só um engano porque negro é burro mesmo. Fui teu amigão. Isso é racismo?
- Eu sei, mas...
- Onde é que está o racismo, então? Fala, Macaco.
- É que outro dia eu quis entrar de sócio num clube e não me deixaram.
- Bom, mas pera um pouquinho. Aí também já é demais. Vocês não têm clubes de vocês? Vão querer entrar nos nossos também? Pera um pouquinho.
- Mas isso é racismo.
- Racismo coisa nenhuma! Racismo é quando a gente faz diferença entre as pessoas por causa da cor da pele, como nos Estados Unidos. É uma coisa completamente diferente. Nós estamos falando do crioléu começar a freqüentar clube de branco, assim sem mais nem menos. Nadar na mesma piscina e tudo.
- Sim, mas...
- Não senhor. Eu, por acaso, quero entrar nos clubes de vocês? Deus me livre.
- Pois é, mas...
- Não, tem paciência. Eu não faço diferença entre negro e branco, pra mim é tudo igual. Agora, eles lá e eu aqui. Quer dizer, há um limite.

- Pois então. O ...
- Você precisa aprender qual é o seu lugar, só isso.
- Mas...
- E digo mais. É por isso que não existe racismo no Brasil. Porque aqui o negro conhece o lugar dele.
- É, mas...
- E enquanto o negro conhecer o lugar dele, nunca vai haver racismo no Brasil. Está entendendo? Nunca. Aqui existe o diálogo.
- Sim, mas...
- E agora chega, você está ficando impertinente. Bate um samba aí que é isso que tu faz bem.

(Luis Fernando Veríssimo)

01 março 2010

IDENTIDADE


Eu gosto desta música, não porque o autor se chama Jorge, mas sim porque ela retrata uma realidade que poucos se dão conta, podem falar o que quiserem, mas esta é a resultante nefasta do Mito da Democracia Racial. A África somos nós! Forte abraço...
Elevador é quase um templo
Exemplo pra minar teu sono
Sai desse compromisso
Não vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...

Quem cede a vez não quer vitória
Somos herança da memória
Temos a cor da noite
Filhos de todo açoite
Fato real de nossa história

Se o preto de alma branca pra você
É o exemplo da dignidade
Não nos ajuda, só nos faz sofrer
Nem resgata nossa identidade

Elevador é quase um templo
Exemplo pra minar teu sono
Sai desse compromisso
Não vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...

Quem cede a vez não quer vitória
Somos herança da memória
Temos a cor da memória
Temos a cor da noite
Filhos de todo açoite
Fato real de nossa história

Se o preto de alma branca pra você
É o exemplo da dignidade
Não nos ajuda, só nos faz sofrer
Nem resgata nossa identidade

Elevador é quase um templo
Exemplo pra minar teu sono
Sai desse compromisso
Não vai no de serviço
Se o social tem dono, não vai...

Quem cede a vez não quer vitória
Somos herança da memória
Temos a cor da noite
Filhos de todo açoite
Fato real de nossa história 
(Jorge Aragão)
iDcionário Aulete

A principal função da educação é seu caráter libertador.

Educar não é repassar informações, mas criar um patrimônio pessoal.